Anorexia, Bulimia e Obesidade

Prof.Dr.Luiz Miller de Paiva

Há três décadas trabalho com anoréticos , bulímicos e obesos.No início, na clínica endocrinologia e, agora, na clínica analítica 

Há obesos que engordam “comendo ar”, no dizer dos próprios pacientes. Ele, em regime severo e  em satisfatório exercício físico, tem  dificuldade de  perder peso. Nestes casos, acredito que haja um erro metabólico constitucional. Vejamos os fatores que interferem no apetite e no depósito gorduroso.

Podemos dividir em três os mecanismos psicofisiopatológicos, intimamente relacionados, causadores dos distúrbios alimentares:

1 - Mecanismo Cerebral

Anorexia e bulimia são doenças psicossomáticas. A causa principal está no ódio à mãe ou a substituta dela. É forma de Tanatismo (auto destruição inconsciente por predominância do instinto de morte) que se  processa da seguinte maneira: as fantasias

Miller de Paiva
Figura 1- Lesão do hipotálamo anterior e antero-mediano


figureinconscientes de agressividade aos pais estimulam ou inibem, lateralmente, os núcleos do hipotálamo lateral produzindo, respectivamente, aumento de orexina ou de leptina ( hormônio que controla também o sono e a vigília) um contrabalançando o outro (orexina aumentada no sangue tende a diminuir a leptina). Por outro lado, após a ingestão de alimento, com a  dilatação do estômago, produz o estímulo do hipotálamo ventro-mediano, elevando o nível de colecistocinina, constituindo o controle ou centro da saciedade. Após excesso de alimento e alto nível de gordura, a leptina encontra-se alta no sangue ativando o núcleo arqueado e é compostas da alfa MSH ( hormônio estimulador dos melanócitos) e CART (peptídeo regulado pela cocaína e  anfetamina). A leptina aumenta o ACTH e TSH. O camundongo geneticamente obeso (ob-ob) apresenta beta endorfina aumentada e leptina diminuída; esta diminuição faz crescer o nível do neuropeptídeo Y (N.P.Y) que é ansiolítico, (Morgan et al).  Ele se origina no núcleo arqueado e amídala. Os neuropeptídeo NPY e AGRP produzidos no núcleo arqueado tem conexões com o núcleo paraventricular e  hipotálamo lateral, pois estimula a secreção do TSH e ACTH, sendo denominados de peptídeos orexigênicos. Na anorexia há baixa de leptina, prolactina, 17 beta- estradiol e citoninas ( interleucina e e TGH- Beta 2 ou fator de crescimento) ao passo que na bulimia a leptina pode estar normal assim como o cortisol ( Montoleone et al) que concorre para diagnóstico diferencial.

A dilatação do estomago produzirá, também, no tronco cerebral, o estímulo para a produção da endorfina, que por sua vez causa bem-estar. Na anorexia nervosa, a pequena  dilatação do estômago já irá produzir a descarga de endorfina e, assim, o saciar é precoce.

O obeso necessita de grande dilatação do estômago para a produção suficiente de endorfina e  sentir-se estão saciado. (19,22,28)

2 - Mecanismo plasmático

Faz-se através do aumento de ácidos graxos livres no plasma, que por sua vez estão influenciados pela lípase e esta sofre o estímulo da betalipotrofina hipofisária, ACTH,TSH, somatotrofina, triiodotironina, epinefrina e  glucagon.Por outro lado, haveria  baixa da  adenosinofosfatase nos eritrócitos que estaria na  dependência da encefalina, havendo também baixa de  colecistocinina que iria atuar no centro da  saciedade.(4,8)

3 - Mecanismo periférico

Haveria falta de  utilização periférica da glicose, produzindo hiperglicemia.

Este distúrbio parece ser genético (ratos obesos e hiperglicêmicos de MEYER ou ob,ob) e por deficiência do  ácido 3,5,3-triiodotiroacético, que exerce efeito lipocítico por inibir a fosfodiesterase,  aumento do  glicerol plasmático e da hidroprolinúria (13),(28), porém a leptina mostra-se diminuída.

Vejamos estes mecanismos com maior detalhe.

 

2.1- Fatores Bioquímicos

No obeso constitucional deve, portanto, haver erro metabólico, uma alteração na produção do  hormônio lipogênico hipofisário (35), ou então um aumento dos ácidos gordurosos livres do plasma ( em grande parte  imputável por excessiva síntese não compensada por uma suficiente disponibilidade de alfaglicerofosfato, necessária para a completa esterificação em triglicerídeos).Ainda poderá  ocorrer utilização periférica alterada da glicose, pois os ácidos graxos livres dependem da maior utilização da glicose no nível do tecido adiposo (5). Há  elevada taxa metabólica nos obesos; ela  é proporcional ao excesso de peso. Os obesos tem menos eficácia em contrabalançar ou ajustar as suas necessidades metabólicas.(19)

Valoriza-se, hoje em dia, a fase metabólica na qual  a adenosinatrifosfatase exerce um poder especial.(8) A mobilização da gordura contendo mais triglicerídeos se dá pela degradação destes em  glicerol e ácidos graxos livres, que são transportados conjuntamente com a albumina. Esta transformação se dá através de uma enzima, a lípase, que por sua vez é ativada pela epinefrina, glucagon.ACTH,TSH e somatotrofina.A mobilização depende da lípase intracelular que é ativada, sendo esta ativação controlada pelo AMP-ciclico que se forma por ação da  adenilciclase, provavelmente relacionada ao  receptor beta-adrenérgico e localizada na membrana celular. O AMP-cíclico agiria como segundo  mediador similar aos primeiros que são os hormônios.

A prostaglandina agiria também, parece que  inibindo o sistema adenilciclase.(6)

Aliás, a encefalina aumenta o potencial da atividade do AMP-cíclico e o excesso de encefalina poderá se dar em conseqüência da exigência do próprio organismo, que por sua vez faz aumentar ainda mais o potencial do AMP-ciclico. A membrana do adipocito no camundongo geneticamente obeso é mais fluida e esta fluidez é normalizada se  colocarmos o animal em alta temperatura.O defeito inclui a atividade da ATP-ase (Na+ -K+),a regulação hormonal da ciclaseadenilato para o isoproterenol e o transporte de glicose; este defeito é  melhorado após a normalização da fluidez da referida membrana. (16)

Dá-se valor a ação do sistema adenosinotrifosfatase para diferenciar os obesos constitucionais ou metabólicos daqueles obesos causados por outros fatores, pois FLIER &col. (8), em 23 obesos, encontraram esta ATP-ase 22% abaixo nos  eritrócitos em relação aos indivíduos não-obesos; como também, a reação a norepinefrina de  calorias, subiu 40% menos nas pessoas magras, assim como parece haver maior quantidade de sódio intracelular (processo que envolve menor gasto de  energia). As catecolaminas e os hormônios tireóideos agem estimulando os processos catabólicos, a lipidomobilização e as lípases, embora suas  aplicações clínicas para os obesos metabólicos ou constitucionais não surtam efeito na devida  normalização do peso corporal.Parece que as anfetaminas teriam um mecanismo de ação análoga ao das catecolaminas (DUBNIK apud CUCURACHI) (5),isto é  estimulariam a lipidomobilização e deprimiriam o  centro do apetite; todavia, esta ação poderá causar efeitos colaterais perigosos nas personalidades  psicóticas, levando-as a desagregação mental.

Em outras espécies de animais, uma linhagem  especial de camundongos, os NZO da Nova Zelândia, criados de modo racional, ocorre variedade de obesidade totalmente diversa: a chamada hiperglicemia hereditária de MEYER (27).Estes animais apresentam, extraordinária sensibilidade ao frio e sucumbem dentro de poucas horas, ao  contrário dos ratos lesados no hipotálamo. A ração desses animais pode ser ingerida rapidamente, mas consumida fracionariamente pelo organismo durante horas. Estudando esses camundongos, MEYER formulou a teoria glicostática. Não seria, segundo esse pesquisador, o nível glicêmico e sim a  utilização da glicose ao nível do sistema nervoso. A hiperglicemia como deficiência da fosforilação da  glicose, ou mesmo pela hexocinase, não seria aproveitada no sistema hipotalâmico; o nível da glicose efetiva estaria baixo.Ainda mais, o potássio e o  fósforo diminuiriam suas ações, pois, com a glicose efetiva alta, haveria baixa do potássio e fósforo, MEYER considera que a glicose dos centros nervosos pode ser medida indiretamente pelo consumo de glicose nos tecidos periféricos, o que se faz por intermédio da diferença entre a glicemia arterial e  a venosa, cuja diferença denominou de  delta-glicose.

Esta estaria correlacionada com o metabolismo calórico, próprio de cada pessoa.

A célula gordurosa é um órgão terminal com tendência a armazenar e mobilizar sob o controle do  sistema nervoso. Estímulos vindos dos tecidos periféricos informariam os núcleos controladores do  apetite.Não se sabe quais são esses estímulos, porém reconhece-se a influência dos níveis glicêmico, hipo e hiperglicêmico, sob a ação da  insulina ou não, e a quantidade de corticosteróide, lisina, carnitina e do co-fator cúprico de dopamina-betá-hidroxilase, que converte a dopamina em norepinefrina (sua baixa pode produzir anorexia nervosa).(14)

Destruindo-se as zonas laterais do hipotálamo (fig.2), produz-se anorexia e o seu estímulo leva á bulimia. Os núcleos ventromedianos exerceriam uma ação inibitória sobre as zonas laterais. A este conjunto dá-se o nome de “ centro de alimentação” e, aos núcleos ventromedianos, de “ centro da  saciedade”, que indicaria o momento em que se  deve parar. A bulimia é, pois, devida à excitação do  núcleo ventromediano do hipotálamo e reflete sobremaneira os conflitos conscientes e inconscientes.Certos obesos neuróticos comem não por fome e sim por necessidade de segurança ( alimento seria um símbolo de segurança). A dexedrina  aumenta a atividade elétrica do núcleo ventromediano e por isso aumenta a inibição do centro da fome (zona lateral), daí a perda do apetite. Devido à correlação desse centro com o córtex, pode-se explicar a obesidade motivada por conflitos psíquicos.

Ratos sob estresse emocional (tipo Ader-Friedman) apresentam aumento dos corpos cetônicos,da glicemia e dos ácidos graxos livres e decréscimo do  ferro sanguíneo e da epinefrina na adrenal.(19).

Crianças obesas (38%) mostram deficiência de ferro e moderada baixa de zinco, alteração nas taxas de imunoglobulinas do soro (complementos C3 e C4) e do número de linfócitos T e B, em relação ás crianças normais, o que vem facilitar a maior incidência de infecção nos indivíduos obesos.(3) No homem, a salivação está diminuída nos pacientes depressivos (queixam-se de boca seca). DURANT & ROYSTON (7) estudaram em obesas a salivação, a sensação de fome e a quantidade de calorias ingeridas e concluíram que a salivação se mostrou discretamente proporcional à energia ingerida; todavia, a fome e o apetite não variaram significativamente.
O estímulo desse mecanismo hipotalâmico de  regulação do apetite parece não ser devido ao tipo de dieta nem á ingestão calórica e sim à manutenção de peso, por ser constante e ideal. Dessa  maneira, o magro que coma muito creme, diariamente,pode engordar, mas, com o decorrer do tempo, começaria sentir repugnância e perderia os quilos ganhos.

O mesmo fato ocorre com a gastrectomia, que  não impede a obesidade por excitação do hipotálamo; os ratos comem pouco, mas freqüentemente.

O indivíduo normal só come o suficiente para satisfazer o seu apetite, porém o apetite do obeso é  exagerado, daí o malogro terapêutico em virtude  de não se poder deixa-lo com fome crônica. Os  anoréticos funcionam, porém o indivíduo não os  ingere a vida inteira, o que leva a engordar de novo.

Certas pessoas não conseguem emagrecer por falta  de força de vontade, não somente por apetite exagerado, como também porque os anoréticos lhes causam grande excitação nervosa. O excesso de  apetite reflete, muitas vezes, a insatisfação psíquica.

O hipotálamo está sob o controle do córtex cerebral, haja visto que, na leucotomia frontal e na  hiperosteose frontal interna, o apetite aumenta, o que leva o paciente a engordar.Existem vários relatos na literatura correlacionando trauma cerebral com EEG alterado e o aparecimento de bulimia, confirmando as zonas do apetite e da saciedade. (35),(36).

Parece não haver dúvida de que deve existir algo no sangue que regula o apetite; ainda mais, as experiências em camundongos em parabiose ( um obeso amarelo possuidor de gene dominante heterozigótico e outro normal, que não desenvolve a  obesidade); isto vem confirmar a existência de uma concentração sanguínea aumentada de substância inibidora do apetite influenciando os núcleos hipotalâmicos, chamada leptina. O aumento da leptina faz diminuir a orexina.

Queda no nível de leptina aumenta o nível de neuropeptídeo Y (NPY) e AgRP que se originam no núcleo arqueado.

A galanina é similar a orexina e leptina no controle do apetite sendo estimulados pelos triglicerídeos.

A galanina produz a síntese e liberação do L.H..Esta correlação é importante para explicar a presença das alterações ovarianas na anorexia nervosa.

Os animais sem dopamina comportam-se como gostassem das comidas mas não a desejassem.Não procura o alimento mas se tiver come.

A estimulação de axônios dopaminérgicos no hipotálamo lateral produz compulsão pelo alimento ( como ocorre na bulimia) sem aumentar o  efeito hedônico do alimento.

O aumento da serotonina no encéfalo diminui o apetite tal como agem a  dexfenflunamina, fluoxetina, etc.

Estas teorias poderiam explicar certos tipos de  obesidade, mas não o mecanismo da obesidade essencial.Este talvez fosse explicado pelo desiquilíbrio da ação entre os hormônios somatotróficos, ACTH(glicocorticóides e mineralocorticóides), antidiurético, insulina, glucagon, ATP-ase eritrocitária e, principalmente o princípio mobilizador dos  lipídeos (21), (37) leptina,orexina e dopamina.

O princípio hipofisário, betalipotrofina (beta-LPH),é o percursor da atividade de outros peptídeos. Desta betalipotrofina derivam a melanotropina (beta-MSH) e endorfina. O anticorpo beta-endorfina reage com a betalipotrofina. No cérebro se dá a síntese dos aminoácidos e suas incorporações para as formações do ACTH, betalipotrofina e endorfina.

Na obesidade da síndrome de Cushing, o ACTH e a betalipotrofina estão aumentados (23), assim como nas mulheres hirsutas por hiperandrogenismo (31).

A injeção de naxolone impede a ingestão de alimento tanto em ratos normais como em ratos com  lesão hipotalâmica, sendo a diminuição da ingestão de alimentos mais acentuada nestes últimos.

O receptor oleáceo localiza-se no núcleo ventromediano. Os animais geneticamente obesos apresentam maior quantidade endógena de beta-endorfina.

Se injetarmos morfina ou endorfina no hipotálamo ventromediano em animais sem apetite, este  aumentará consideravelmente, ipso facto, se injetarmos o antagonista oleáceo, naltrexone, produziremos a supressão da hiperfagia (25), embora  O’BRIEN & col.(31) não o tenham confirmado na  espécie humana.

Em certos casos, a causa da obesidade não só seria, portanto, o excesso de alimentação ou a falta  de exercício físico, como também poderia ser  devida ao consumo diminuído de energia (queimam menos calorias) por defeito genético; hipóteses estas que precisam ser confirmadas.   

Em seguida o autor aborda a incidência da anorexia ( expulsão de  objeto mau, ex. alimento-símbolo) e  da bulimia ( falta de mecanismo de repressão) aparecendo inúmeros sintomas clínicos devido à correlação destes sintomas com outras alterações hormonais do hipotálamo, tais como amenorréia ou diversos tipos de depressão, obsessões, hipocondria, histeria, ansiedade e laríca ( algo bom que passa na garganta), e dependência. A anorexia pode ser de  3 tipos;completivo, neurótico e psicótico ( que pode acarretar o suicídio). O diagnóstico diferencial se processa pelas dosagens e testes hormonais: GH,ACTH,TSH,TRH,FSH,LH, nor-epinefrina, fenilglicol prolactina, cortisol, estradiol e de- idro-iso-androsterona, como nos mostra o quadro anexo além dos testes psicológicos:Garner, Rorschach e Eysenck. A anorexia é “prima-irmã ” da esquizofrenia. A anorexia e bulimia são somatizações psicóticas paralógicas criando fantasia de outro engendramento, filha colada á mãe, um neo-objeto que é o alimento-símbolo e se cola a ele (Godoy Moreira), havendo ruminação, regurgitação, objeto transacional com alterações na imagem corporal acabando por exercer segurança (identificação adesiva) ou ser auto castigo (kummerspeck) ou ainda  bulimia ou obesidade por agressão a outrem. (agredir para ser agredido).

O tratamento deve ser medicamentoso (drogas antipsicóticas, pimozida,olanzapina,risperidal e aripiprazol) associado à psicanálise ou grupanálise, com orientação familiar (Millieu Therapy) para alcançar o “portance” e assim transformar o analista mãe-má em mãe- boa., evitando no caso dos obesos mórbidos, que necessitam submeter-se à gastrectomia parcial. 

As mães, principalmente durante a lactação através do reverie, produzem a formação de um “ engrama da fome”; se ela valoriza, excessivamente, o alimento ou super solicitá-lo (mamadas a todo o momento) torna o alimento um símbolo de prazer ou desprazer, segurança ou insegurança, enfim, objeto ruim ou bom, fato  este que  acarretará uma confusão nos valores do indivíduo. As experiências certas ou erradas ficarão codificadas no cérebro, pois a sucção do seio é a  primeira maneira de expressar amor.

A nosso ver, a anorexia, bulimia e obesidade mórbida não são psicoses monossiotomáticas; são uma síndrome do sistema límbico, instalada em  indivíduos com ego arcaico e esburacado sobre o qual mensagens bruxas dos pais fazem com que o paciente os sinta como objetos maus. Os doentes acabam se  movendo em um mundo do “objetos bizarros”, confundindo fantasias com realidades, cujos alimentos seriam impregnados de partes ruins, os seios que  envenenam, daí sofrem de doenças tanáticas.

O obeso, assim como o magro ( na anorexia nervosa), superestima o esquema corporal. O primeiro “precisa” estar obeso e o segundo estar magérrimo para se autocastigarem. 

Os trabalhos de  GLUCKMAN & HIRSCH (11) e GARNER & col. (10), através de fotografias do aparelho para visualizar partes do corpo e do teste psicológico de Eysenck reveladores de auto-estímulo, comprovam a importância desta autopercepção do esquema corporal.

Estas experiências vêm explicar, em parte, a necessidade que têm os pacientes obesos de  mudarem de médicos; novo especialista seria um novo estímulo ( ficam, também, com vergonha perante o  facultativo em não ter emagrecido) para ver se  conseguem, conscientemente, perder esta imagem corporal, mas que, inconscientemente, “precisam estar com ela para se castigarem e às vezes agredirem outrem: é o tanatismo”. Na anorexia nervosa existiria um sentimento de ineficiência; olhar o  próprio corpo esquelético seria não ter o “objeto mau” introjetado no tecido adiposo. Fato similar ocorreria em certo tipo de obeso: ele teria que “verificar” o objeto mau no tecido adiposo para se  castigar ainda mais; seria uma distorção da imagem  corporal por sentimentos de desespero.Esta  distorção de imagem corporal se processaria desde o  primeiro período de molde, durante a lactação, pela  ambivalência à mãe, tornando-se incapaz de desenvolver satisfatoriamente os seus sentimentos ao seu próprio ego corporal, por causa da hostilidade à mãe.

MEYER & PUDEL (26) estudaram o apetite em  mulheres, num grupo sem ver alimentos e outro podendo observar os vários tipos de alimento, mas sem poder ingeri-los a bel-prazer. Concluíram que reações hiperfágicas podem ser secundárias a distúrbios emocionais, sendo possível fator etiológico na obesidade. Todavia, as crianças e velhos podem  não apresentar polifagia emocional. As desordens da saciação variam com a idade e o peso corporal, pois os velhos obesos não apresentam a baixa e  lenta ingestão de alimentos. A dilatação súbita do  estômago, por estímulo do centro da saciação, é  nos obesos menos rápida, isto é, parece haver  deficiência no cérebro em detectar a quantidade  de alimento que pode ser assimilado, fator este de  suma importância  para regular a quantidade de alimento e calorias ingeridas. Na anorexia nervosa este reflexo está hiperativo e, logo que haja  pequena dilatação no estômago, cessa o apetite. (30,d).

O final da absorção dos alimentos de uma refeição não poderia explicar a cessação da fome e,  assim, a saciedade ao alimento estaria também no que o referido alimento simbolizaria STUNKARD (33) relata que durante a presença de contrações estomacais em mulher obesa, em jejum, usualmente não se refere sensação de fome ou vazio epigástrico ou o desejo de comer, enquanto que  a não obesa, usualmente refere esta sensação.

2.3 Bulimia- Período de Molde

A nosso ver, excesso ou falta de apetite, embora inato, dependeria dos primeiros meses de vida, no contato do bebê para com a mãe – é o primeiro período de molde. Todavia, HEBB (14) acha que a  sensação de saciar-se não é inata e dependerá da educação,BRUCH (2,a) acha que o fator genético sofre também influência do meio. O recém-nado não é  mais a tabula rasa do homúnculo. A criança pode  aprender, em determinados períodos de tempo, e,para o apetite, aprende desde o momento do  nascimento.

Existem dois tipos de apetite: 1) fome por alimento;2)fome pelo que o alimento simboliza ou representa (afeto).Neste último caso, é que  a insaciabilidade torna-se importante.Estas condições dependem do primeiro relacionamento com a mãe.

Esta não tendo capacidade de reconhecer o choro da criança... se por fome, estar suja ou molhada, estar com calor ou por necessidade de afeto, poderá produzir uma desorganização no bebê em relação ao apetite. Daí a importância da eficácia da  psicoterapia para o obeso; o terapeuta deverá saber distinguir os diversos tipos de angústia do  paciente, relacionados ou não com os alimentos.Acredito em fome inata tal qual descreveu FREUD (9), porém fatores ambientais podem desenvolver em  demasia esta condição instintiva.

Para melhor compreendermos a importância dos  instintos e a complexidade do seu funcionamento, exemplificaremos com o instinto de fome a posição esquizoparanóide de KLEIN & col. (22), sabemos que a  fome, e a subseqüente hiperglicemia que acarreta,produz mal-estar, e , em certas pessoas, leva à  angústia e á irritabilidade hostil; sabemos, também, que na fase esquizóide da lactação a criança está  fragmentada; quando não predomina a fome, em  relação ás outras necessidades instintivas, tornam-se débeis e desagregam-se, concentrando todos os  esforços de defesa na sucção mamária; porém em  fantasia inconsciente e instintiva agride o seio que  o nutre, porque também este frustra, o que  resulta em um sentimento de culpa, levando a criança entrar com dificuldade na fase depressiva, que é reparadora.

Segundo LIMA (24), o indivíduo nasce com  maior ou menor apetite, dependendo da sua constituição mesomórfica ou ectomórfica; o esquizofrênico melhora com insulinoterapia, porque a hiperglicemia produzida pela insulina faz reavivar o instinto de  fome e com ela a agregação da personalidade fragmentada, saindo assim da posição esquizóide e  entrando, através da agressão, na fase paranóide. A provocação do instinto da fome, e um esforço para  sacia-la, reforçaria, no esquizofrênico, os instintos parciais, isto é, as cargas efetivas da fome, produzindo, então, a reintegração da personalidade.

A sucção dos seios é a “ primeira maneira do indivíduo de expressar amor”; se o seio frustra, surge, então, uma ansiedade decorrente do perigo de tratar o seio, e depois a mãe toda, por represália.

No estado esquizóide, o trauma  do primeiro período oral de sucção conduz a uma reação conforme a  idéia de que o amor da criança, sua necessidade libidinosa ao seu objeto de amor, o seio materno, é  mau e destrutivo, de maneira que chega a ter medo de amar, porque o amor é destruidor, e vai ao estado esquizóide típico. Em um segundo período, o  trauma do segundo período oral provoca na criança a idéia de que não é amada, porque  o seu ódio é  mau e destruidor; chega à angústia de amar por  medo de odiar, pois o amor está contaminado pelo ódio.Estes estados formam a base da obesidade futura, sendo ela, então, uma manifestação direta da dependência infantil.

Conforme ascendemos na escala filogenética, os  instintos se entibiam e submetem-se cada vez mais às exigências da cultura, como sistema de  adaptação.

A primeira vista, um indivíduo com fome seria o resto da vida feliz se estivesse garantido o seu  sustento; contudo, o homem só vive para comer quando há fome, porém, quando está satisfeito com  o alimento,aparecem outras necessidades de nível superior que dominam o organismo mais do que  as necessidades básicas. Há, pois, uma hierarquia de instinto de predomínio relativo. A satisfação é, na teoria da motivação, um conceito tão decisivo como a privação, pois libera o organismo das necessidades fisiológicas. Se as necessidades fisiológicas estão satisfeitas, como as de segurança, aparece, então, a necessidade de amor, afeto ou posse; se essas necessidades psicológicas não são satisfeitas, torna-se frustrado e mal ajustado, com  comportamento neurótico, isto é, a satisfação de  auto-apreço, de autoconfiança, capacidade de ser útil à humanidade é tão necessária como a  satisfação da fome, do sexo, etc., pois as suas  insatisfações causam sentimentos de inferioridade, impotência e depressão. Então, a depressão, a ansiedade e outras emoções tomam parte importante na patogenia da obesidade.

O paciente obeso, na maioria das vezes, tem, pois, um inapropriado reconhecimento da saciedade e ele não tem “fibra” isto é, tem pouca iniciativa quando confronta novas situações, tais como em regime, na escola, no trabalho ou na sociedade.

O modelo de interação mãe-bebê é, portanto, de  capital importância na formação da personalidade.

A contínua interação entre criança e alimento é  acompanhada por experiências emocionais- afetivas indeléveis.

A deficiência individual no sentimento de separação acarreta ao ego limites difusos, daí a  tendência maior do obeso em ter maior comunicabilidade e sociabilidade, embora forçadas e sofridas.

As mães concorrem muito para a formação de  um “engrama da fome”, se ela valorizar excessivamente o alimento ou super solicitá-lo, tornando a comida um símbolo de prazer ou desprazer, segurança, ou insegurança, enfim, objeto ruim ou bom, fato este que acarretará uma confusão nos valores da criança e depois no adulto. As experiências certas ou erradas ficam codificadas no cérebro.

BRUCH (2,c), estudando 40 crianças obesas em Nova York, chamou a atenção para a importância dos fatores psicológicos na obesidade, tais como a superproteção materna e a não-rejeição a esta superproteção, ou ambivalência da criança a esta  situação, além das experiências que estas crianças tiveram relacionando alimento com as atividades sociais e frustrações emocionais ( crianças amamentadas insuficientemente pelo seio ou alimentadas por mamadeiras), pais infelizes e, finalmente, criança rejeitada e sofrendo de bulimia (comer seria um prêmio de compensação).

Para confirmarem ou não o trabalho de BRUCH (2,c), quatro pesquisadores dinamarqueses fizeram esse estudo em vários grupos de crianças e chegaram á seguinte conclusão: IVERSEN (18) selecionou 40 crianças obesas de 4 a 14 anos  e fez um exame psiquiátrico e um inquérito em seus pais. Concluiu que o fator psicogenético poder-se-ia estabelecer certamente em 16 ( em 13 deles a obesidade havia se  instalado depois dos 3 anos de vida); nos restantes, era duvidosa a existência do fator psicogenético.

Em 20 casos encontrou uma superproteção materna aceita pelas crianças.Concluiu que os fatores psicogenéticos superimpostos aos fatores constitucionais são importantes na etiologia da obesidade.

NIELSON (32), estudando 61 crianças obesas à luz dos trabalhos de BRUCH, não conseguiu provar a característica falta de cuidado social e psicológico do meio ambiente, nem a característica de  super proteção materna; achou que o hábito de  superalimentação na família, associado à inatividade  muscular, é que seriam os fatores capitais na gênese da obesidade. Entretanto, em estudo individual, notou que, desses 61 casos, 9 eram tipicamente de  obesidade psicogenética e 12 duvidosos. Ambos autores não fizeram estudo dos controles e não  usaram a análise psíquica, o que tornou difícil uma interpretação exata.

QUAAD (34), em 2.262 crianças, verificou que 6% eram obesas. A obesidade podia ser produzida por fatores psicológicos, que decidem a atitude da  criança no meio ambiente para adquirir o alimento. Acha, entretanto que o fator mais importante seria o hábito alimentar da família.

Finalmente, TOLSTRUP (6) estudou 40 crianças obesas e não-obesas sob o ponto de vista de  HELDER BRUCH. Verificou que os obesos comiam mais e apresentavam menor atividade muscular. Observou que, em 7 deles, a etiologia era psicológica; em 11, a base psicogenética era provável; em 23 não havia problema psicológico e pôde também notar a influência dos hábitos alimentares da família (excesso de hidratos de carbono).Concluiu que na  etiologia da obesidade entram vários fatores, inclusive os psicológicos; mas em outros casos a  etiologia seria tradição dos hábitos alimentares.

Entretanto, a maior critica ao trabalho dos dinamarqueses, é que eles não utilizaram a psicanálise para um estudo mais profundo sobre os complexos e sentimentos dessas crianças obesas. Contudo, a conclusão de que 25,6% das crianças obesas tinham como etiologia os fatores psicogenéticos puro, alta percentagem para um estudo como esse, faz ressaltar a importância do psiquismo.

Incluímos a obesidade como forma de tanatismo quando o indivíduo sabe que o se excesso de peso pode acarretar perturbações vasculares e nervosas, principalmente se o indivíduo for diabético, podendo vir a sofrer de infarto do miocárdio ou hipertensão ou acidente vascular cerebral ou neuropatias com algias severas, etc.

Há pessoas que engordam após tensão nervosa, originada por diversos motivos, cujo excesso de  ingestão de alimentos dever-se-ia aos seguintes fatores.

2.5.1 Bulimia por ansiedade

Certas pessoas não conseguem emagrecer por  falta de força de vontade, não somente por apetite exagerado, como também porque as drogas anoréticas lhes causam grande excitação nervosa. O excesso de apetite reflete muitas vezes a insatisfação psíquica. Por exemplo, o bebê, quando chora, sente-se mal; logo que come, sente-se bem; uma vez adulto, diante de qualquer aborrecimento ou tensão nervosa, come para sentir-se bem, tal como fazia quando bebê.

Em linguagem “bioniana”; introjeta o objeto bom para combater o desconforto causado pelo  “não seio”, mas, muitas vezes, ingere de acordo com as  suas fantasias, o seio mau, o que vai causar maior insatisfação do que a própria fome (29-a,b).

Certos obesos, consciente ou inconscientemente, encontram portanto, no alimento, uma forma de  amortecer suas emoções.

2.5.2 Bulimia como defesa e substituta do Amor

O alimento pode ser, além de um substituto do  amor, uma expressão de amor- “fulana é uma uva”, “ fulano é um doce de coco” – como pode ser expressão de descontentamento- “ fulano é  um abacaxi”.

É comum o conceito de que, ao se visitar uma  pessoa e não se recebendo da mesma café com  bolo ou um aperitivo, não se estaria sendo  recebido com carinho. A mãe, que se referindo ao  alimento diz: “ você ficará mais forte se comer bem”, estará concorrendo para fixar no alimento os  futuros problemas emocionais de segurança.

Tivemos uma paciente solteirona que não podia conciliar o sono se não ingerisse tabletes de chocolate; durante sua análise, foi descoberto que o  chocolate simbolizava seio materno. Na infância fora criada por mãe pouco afetiva e agressiva; não  conheceu o pai, jamais conseguiu amar um homem por medo de ser um dia abandonada; só em pensar nesse tipo de sofrimento, preferia nem começar um namoro. A sua adiposidade era uma defesa, pois se emagrecesse ficaria “apetitosa”, isto é, desejada, o que representaria um perigo: entregar-se sexualmente e depois ser rejeitada.

A análise mais profunda revelou não somente essas causas da obesidade, mas também o desejo inconsciente de agredir a mãe, não se casando (era o maior sonho de sua mãe!); por esse motivo, o  medo de casar e ser abandonada era devido ao  sistema bumerangue; eu agrido e tenho pavor de  ser agredida pelo objeto bizarro, isto é,  transformaria o cônjuge como sendo capaz de ter grande poder de maldição.

É, portanto, a obesidade por tanatismo, isto é, agride-se pela obesidade e com isso irá agredir outra pessoa.

Tivemos, também, o caso de uma mulher para  qual o alimento era um substituto do carinho, pois o marido era jogador e passava a maior parte do  tempo fora de casa, e a paciente não se distraia.

Comer era alimentar-se de amor, mas era, também, agredir o marido, que detestava mulher obesa. Por outro lado, o alimento pode significar segurança, tal como o caso de um paciente religioso que fora criado na pobreza e cujos alimentos não  podiam ser desperdiçados. Comia tudo o que lhe punham no prato sem deixar migalha.Desperdiça alimento seria pecado!

As mães neuróticas salientam demasiadamente a importância dos alimentos; querem que os filhos comam tudo que colocam no prato com o intuito de  protege-los contra as doenças. Pode acontecer que  um indivíduo criado nessas condições, quando tiver um prejuízo financeiro ou fortes aborrecimentos, deixe de comer não só por falta de apetite ou por falta de prazer em viver, mas, também, por  falta de proteção (materna).O fato contrário, como já foi dito, poderá ocorrer: comer demasiadamente para se proteger. A satisfação do apetite é, além de motivo de prazer, um símbolo de segurança.Um adulto que não encontra satisfação na vida, rechaça  o intenso desejo de afeto dos demais e se refugia nas pautas primárias da conduta, as insatisfações orais.Tenho observado maior dificuldade na  execução do regime em obesas criadas por mães pouco afetuosas. 

Esse tipo de obesidade não se  enquadra no tanatismo.

2.5.3 Bulimia por auto-agressão e  Introjeção de objeto-tanático

É na hora das refeições que a família se reúne.É nesse momento que se discute os problemas individuais e sociais, domésticos, religiosos, etc.

E é nesse momento que fica relacionado o alimento com o motivo da discussão. Pode haver uma superposição de imagens ( por exemplo, ao se comer uma torta de camarão, discute-se um assunto extremamente desagradável; relacionando-se,  posteriormente, esse prato com aquele assunto, deixar-se á  de aprecia-lo e o prato não será mais  apetitoso).

Durante o tratamento psicanalítico, descobrem-se regressões oral-digestivas conseqüentes  às proibições genitais de uma mãe má, tal proibição condicionada a determinados alimentos, por exemplo:um indivíduo não come carne por ter esta um  significado genital latente ( pênis), embora necessite dela por representar um símbolo de segurança.

Por outro lado, a alimentação farinácea e Láctea, que leva a engordar, pode ter um significado de  proteção materna. Todavia, esta proteção poderá ser falsa; seria como uma bola envolta por uma pequena camada libídica, mas seu conteúdo repleto de coisas ruins, objetos tanáticos. Esta obesidade “ farinácea” seria uma identificação com a mãe  falsamente boa; tornar-se-á um tanatismo se este obeso por querer, inconscientemente, agredir a  mãe, não se casar.

Consideramos a obesidade como sendo provocada por uma mãe má internalizada, proibidora da  genitalidade do indivíduo (castradora) e obrigando a se alimentar de substâncias gordurosas, sendo estas um substituto materno, o que poderia chamar de obesidade de penalidade (“Kummerspeck”).

2.5.4 Bulimia por agressividade

Temos observado que certos indivíduos engordam para agredir outrem, tais como a mãe, pai,marido, esposa, etc.; seria forma sutil de  predomínio do instinto de morte.
Segundo a nossa experiência psicanalítica, a maioria dos obesos tem causas entrelaçadas, como para aliviar a ansiedade de uma autodestruição por sentimentos culposos. É neste caso que a obesidade por agressão, e para se agredir, está incluída nos casos de tanatismo.

Em certos casos, a dificuldade de executar o  regime reside na vontade do marido não gostar de mulher magra. A obesidade da esposa, motivo de  pouca atração ao sexo oposto, seria um  meio para  se proteger de uma esposa adúltera. Seria um complexo de inferioridade e insegurança do homem.

Algumas vezes a polifagia seria uma forma de  insatisfação sexual, seria um desejo inconsciente de fazer a felação ou cunillingus.

Há obesos que abjuram tanto a adiposidade, que  chegam a sonhar com palanque enferrujado, pau podre, o que teria o significado de envelhecimento e autodesprezo. Outros adoram tanto os alimentos, que em sonhos participam de lautos manjares.

Há indivíduos gordos que só vivem para comer e dormir; seriam lactantes semelhantes ao Joe Dickens nas “Aventuras de Pickwick” ou ao  Sancho de Cervantes.

Quanto aos fatores que agem nos obesos, seriam  eles: 1)predomínio genético;2)exaltação da passividade e supervalorização dos hábitos orais transmitidos pelos grupos familiares; 3) pouca disposição para o exercício; 4) filho superprotegido;5) pai ausente ou débil; nestas condições, há  fixação na fase oral e hipotrofia da anal e genital; 6) conflitos inconscientes, objeto mau internalizado; 7) por tanatismo, agredir para ser agredido.

Outra forma, porém mais grave de tanatismo, vamos encontrar no obeso com diabetes melito e  que executa mal o tratamento, isto é, não faz certo o regime ( muitas vezes por achar que com as sulfas não haveria necessidade do regime) e acaba com aterosclerose, hipertensão e acidentes  vasculares.

Devemos relacionar o paciente diabético com o obeso, no sentido psicológico, não só porque existe uma incidência maior de diabéticos em indivíduos obesos e predisposição genética em ambos, mas principalmente porque eles reagem aos traumas psicológicos, conscientes ou inconscientes, da  mesma maneira, isto é, pela bulimia, ou melhor, pela maior excitabilidade dos núcleos ventromedianos do hipotálamo.Os indivíduos podem reagir de  maneira diferente aos mesmos traumas.Em geral, os obesos ou diabéticos tiveram traumas na fase oral, motivo pelo qual qualquer emoção, boa ou má, os faz comer ou ingerir alguma coisa. A satisfação oral para o gastrônomo é tão importante que  constitui uma diversão especial, igualando-se a qualquer outro tipo de festa, e o diabético é um  gastrônomo de hábito constante. O diabético, tal como o obeso, é uma criança: mente, rouba, “faz feio” e torna-se egoísta para satisfazer o seu apetite; se a educação não permite, comporta-se como um cavalheiro ou uma dama na sociedade, para depois chegar em casa abrir a geladeira e o armário, “devorando” os doces e comidas, “ supercompensando” o que não pode fazer na frente dos parentes, “ controladores” e “supervisores” de sua doença.

A dificuldade do tratamento dietético do diabético e do obeso reside na sua falta de força de vontade e na sua “ capacidade de mentir” ao médico, no sentido de ter executado de maneira exata a dieta prescrita. Em grande número de vezes “ mentem inconscientemente”.

De acordo como descrevi, os obesos tanáticos, e pela exposição sobre a psicopatologia do excesso de apetite, as causas da obesidade são várias e mesmo a obesidade essencial ou constitucional ou  por erro metabólico apresenta plularidade de  fatores, o que torna mais difícil a sua  compreensão.

Todavia, a nossa experiência clínica nos faz crer na importância capital da medicina profilática. O indivíduo, mesmo antes de casar, deve se reeducar tanto no ponto de vista de higiene física como psíquica. Por este motivo, acho indispensável um tratamento combinado:psicoterapeuta, endocrinologista, fisioterapeuta, nutricionista e assistente social.

Pelo exposto fica evidente que em certos obesos o exercício aumenta a polifagia e em outros queima mais calorias; neste tipo é que se deve prescrever o exercício físico. 

Certos indivíduos tem tipo de  obesidade hidrófila, isto é, com alteração do  hormônio antidiurético. Nestes casos, um diurético, tal como a hidroclorotiazida, poderá ser de utilidade no início do tratamento, porém, por resistência e  autopunição inconsciente ( não tendo o direito de emagrecer por sentimento inconsciente de culpa), o medicamento não pode surtir o efeito desejado, isto é, diurético. Aliás, em geral, o obeso retém menos água ( o conteúdo hídrico nos tecidos adiposos é até inferior, em porcentagem, ao conteúdo do tecido gorduroso do indivíduo normal) (MOURSE apud CUCURACHI & col (5). Por outro lado,o endocrinologista deveria prescrever um anorético para  um obeso neurótico, porém somente em  concordência com o psicoterapeuta  ( pois existem obesos que “ parecem tolerar” estas drogas, mas só o  psicoterapeuta saberá da gravidade do seu estado psíquico, isto é, se ele terá tendência a reagir à  droga).Todo cuidado será pouco. O psicoterapeuta jamais deverá ser impaciente com o paciente  quando este abandona a dieta ( mesmo sendo criança); orientar a família da necessidade do regime de  toda família (“ o que os olhos não vêem, a boca não  sente”). O psicoterapeuta de formação analítica  somente interpretará a própria atitude e deverá ficar neutro para receber tanto o bom como o ruim do paciente e devolver sempre o bom para a suficiente segurança do indivíduo para assim ele não se utilizar da somatização.

O tratamento da obesidade seria, portanto, eclético e principalmente profilático, evitando-se na família os desajustes dos pais que podem traumatizar o indivíduo  nos períodos de molde e assim  não ocorreriam confusões emocionais causadoras de excesso de apetite.A psicanálise ou psicoterapia de grupo e o regime alimentar associado ( por outro especialista) são, no dia de  hoje, a maior arma que se dispõe  para  o combate desse mal social, pois o obeso é vitima de atitudes sarcásticas e jocosas, o que ocasiona desgostos e  infelicidade.

O paciente acaba percebendo que Deus nos fez diferentes, que cada um tem um defeito ou um desajuste.O obeso por sua vez, nasceu com essa  constituição; mas sendo um defeito corrigível, deve se consolar. A maioria deles pode, uma vez normalizado o peso, abusar 2 e até 3 vezes por semana, ou em aniversários ou festas, o que já é uma grande coisa. Os pacientes ficam também sabendo das conseqüências  da obesidade, como a insuficiência cardíaca, hipertensão e complexo de  inferioridade, o que poderá ajudar o indivíduo a executar o regime.

Pela minha experiência de tantos anos, recomendo em primeiro lugar  a psicoterapia analítica de grupo, duas vezes por semana, associada a  análise individual por semana.É de duração longa, mas não vai somente ajudar o paciente emagrecer e sim amadurecer a sua  personalidade para ser feliz no lar, na sociedade e no trabalho.

Finalmente, posso dizer, baseado em minha experiência, que o obeso está dominado pelo instinto de morte (autodestruição); o tratamento da obesidade depende, portanto, mais dos conflitos inconscientes produtores de culpa e tanatismo, do que de  dieta, drogas e exercício.   

Bibliografia:  

Jornada Psicanalítica, 22 de março de 2003

 

 “Anorexia, bulimia e obesidade”.

 

                                               
Resumo

Anorexia e bulimia são doenças psicossomáticas. A causa principal está no ódio à mãe ou a substituta dela. É forma de Tanatismo ( auto destruição inconsciente por predominância do instinto de morte) que se  processa da seguinte maneira: as fantasias inconscientes de agressividade aos pais estimulam ou inibem, lateralmente, os núcleos do hipotálamo lateral produzindo, respectivamente, aumento de orexina ou de leptina ( hormônio que controla também o sono e a vigília) um contrabalançando o outro ( orexina aumentada no sangue tende a diminuir a leptina). Por outro lado, após a ingestão de alimento, com a  dilatação do estômago, produz o estímulo do hipotálamo ventro-mediano, elevando o nível de colecistocinina, constituindo o controle ou centro da saciedade. Após excesso de alimento e alto nível de gordura, a leptina encontra-se alta no sangue ativando o núcleo arqueado e é composta da alfa MSH ( hormônio estimulador dos melanócitos) e CART (peptídeo regulado pela cocaína e  anfetamina). A leptina aumenta o ACTH e TSH. O camundongo geneticamente obeso (ob-ob) apresenta beta endorfina aumentada e leptina diminuída; esta diminuição faz crescer o nível do neuropeptídeo Y (N.P.Y) que é ansiolítico, (Morgan et al).  Ele se origina no núcleo arqueado e amídala. Os neuropeptídeo NPY e AGRP produzidos no núcleo arqueado tem conexões com o núcleo paraventricular e  hipotálamo lateral, pois estimula a secreção do TSH e ACTH, sendo denominados de peptídeos orexigênicos. Na anorexia há baixa de leptina, prolactina, 17 beta- estradiol e citoninas ( interleucina e e TGH- Beta 2 ou fator de crescimento) ao passo que na bulimia a leptina pode estar normal assim como o cortisol ( Montoleone et al) que concorre para diagnóstico diferencial.

Os animais com dopamina comportam-se como gostassem da comida mas não a desejasse, tal como ocorre na clínica com os distúrbios alimentares. Os animais não procuram o alimento, mas se tiver come-o. A estimulação de  axônios dopaminérgicos no hipotálamo lateral produz compulsão pelo alimento, como soi ocorrer na bulimia, sem aumentar o efeito hedônico do alimento. Por outro lado, o aumento da serotonina no encéfalo diminui o apetite como agem a dexfenfluramina e fluoxetina. No caso da cocaína, em sitio-chave de ação é no núcleo accumbens, pois a cocaína (mesmo a nicotina) prolonga a ação da dopamina neste núcleo, levando tolerância á droga ou a um determinado alimento. No controle do apetite existem três  mecanismos: cerebral, plasmático e periférico, nos quais entram em ação da endorfina, lípase, betalipotrofina, glucagon, tiroxina e adenosinotrifosfato.

Em seguida o autor aborda a incidência da anorexia ( expulsão de  objeto mau, ex. alimento-símbolo) e  da bulimia ( falta de mecanismo de repressão) aparecendo inúmeros sintomas clínicos devido a correlação destes sintomas com outras alterações hormonais do hipotálamo, tais como amenorréia ou diversos tipos de depressão, obsessões, hipocondria, histeria, ansiedade e laríca ( algo bom que passa na garganta), e dependência. A anorexia pode ser de  3 tipos;completivo, neurótico e psicótico ( que pode acarretar o suicídio). O diagnóstico diferencial se processa pelas dosagens e testes hormonais: GH,ACTH,TSH,TRH,FSH,LH, nor-epinefrina, fenilglicol prolactina, cortisol, estradiol e de- idro-iso-androsterona, além dos testes psicológicos:Garner, Rorschach e Eysenck. A anorexia é “prima-irmã ” da esquizofrenia. A anorexia e bulimia são somatizações psicóticas paralógicas criando fantasia de outro engendramento, filha colada á mãe, um neo-objeto que é o alimento-símbolo e se cola a ele (Godoy Moreira), havendo ruminação, regurgitação, objeto transacional com alterações na imagem corporal acabando por exercer segurança (identificação adesiva) ou ser auto castigo (kummerspeck) ou ainda  bulimia ou obesidade por agressão a outrem. (agredir para ser agredido).

O tratamento deve ser medicamentoso (drogas antipsicóticas, pimozida,olanzapina,risperidal e aripiprazol) associado a psicanálise ou grupanálise, com orientação familiar (Millieu Therapy) para alcançar o “portance” e assim transformar o analista mãe-má em mãe- boa., evitando no caso dos obesos mórbidos, que necessitam submeter-se a gastrectomia parcial. 

As mães, principalmente durante a lactação através do reverie, produzem a formação de um “ engrama da fome”; se ela valoriza, excessivamente, o alimento ou super solicitá-lo (mamadas a todo o momento) torna o alimento um símbolo de prazer ou desprazer, segurança ou insegurança, enfim, objeto ruim ou bom, fato  este que  acarretará uma confusão nos valores do indivíduo. As experiências certas ou erradas ficarão codificadas no cérebro, pois a sucção do seio é a  primeira maneira de expressar amor.

A nosso ver, a anorexia, bulimia e obesidade mórbida não são psicoses monossiotomáticas; são uma síndrome do sistema límbico, instalada em  indivíduos com ego arcaico e esburacado sobre o qual mensagens bruxas dos pais fazem com que o paciente os sinta como objetos maus. Os doentes acabam se  movendo em um mundo do “objetos bizarros”, confundindo fantasias com realidades, cujos alimentos seriam impregnados de partes ruins, os seios que  envenenam, daí sofrem de doenças tanáticas.