Os últimos estudos sobre os núcleos hipotalâmicos referentes ao apetite veio confundir, ainda mais, a patogenia da anorexia, bulimia e obesidade, haja visto, o estímulo do núcleo lateral do hipotálamo que produz falta de apetite; pela liberação da leptina pode, também, ser produzido pela orexina, ou pela galanina, ocorrendo pouco esclarecimento como agem esses neuro-hormônios.
Contudo, o conhecimento atual evidenciou, que a anorexia e bulimia não são psicoses monossintomátias, são mais uma síndrome do sistema límbico, instalada em indivíduos com ego arcaico e esburacado sobre o qual as mensagens bruxas dos pais fazem com que o paciente os sinta como objetos maus. Os doentes acabam se movendo em um mundo de “objetos bizarros”, confundindo fantasias com realidades, cujos alimentos seriam impregnados de “coisas ruins”, os seios que envenenam daí sofrerem de doenças tanáticas.
A causa principal está no ódio à mãe ou a substituta dela.É a forma de Tanatismo (auto destruição inconsciente por predominância do instinto de morte).
Há três décadas trabalho com anoréticos , bulímicos e obesos.No início, na clínica endocrinologica e, agora, na clínica analítica.
Há obesos que engordam “comendo ar”, no dizer dos próprios pacientes.Eles, em regime severo e em satisfatório exercício físico, tem dificuldade de perder peso.Nestes casos, acredito que haja um erro metabólico constitucional.Vejamos os fatores que interferem no apetite e no depósito gorduroso.
Podemos dividir em três os mecanismos psicofisiopatológicos, intimamente relacionados, causadores dos distúrbios alimentares:
Anorexia (falta de apetite) e bulimia (episódios de voracidade alimentar com vômito forçado) são doenças psicossomáticas. A causa principal está no ódio inconsciente à mãe ou a substituta dela. Causando sentimento de culpa inconsciente que se processa da seguinte maneira: as fantasias inconscientes de agressividade aos pais estimulam ou inibem, lateralmente, os núcleos do hipotálamo lateral produzindo, respectivamente, aumento de orexina ou de leptina ( hormônio que controla também o sono e a vigília, e é codificada pelo gene ob e ativam o núcleo arqueado, um contrabalançando o outro).A orexina aumentada no sangue tende a diminuir a leptina) ( Bear et al 2002). Por outro lado, após a ingestão de alimento, com a dilatação do estômago, produz o estímulo do hipotálamo ventro-mediano, elevando o nível de colecistocinina, constituindo o controle ou centro da saciedade. Após excesso de alimento e alto nível de gordura, a leptina encontra-se alta no sangue ativando o núcleo arqueado e é composta da alfa MSH ( hormônio estimulador dos melanócitos; é um peptídeo anorético) e CART (peptídeo regulado pela cocaína e anfetamina). A leptina aumenta o ACTH e TSH. O camundongo geneticamente
O lócus ceruleus pode influenciar quase todas as partes do encéfalo, aumentando a capacidade cerebral de responder a estímulos (alerta geral quando o indivíduo está vigilante. (Fuxe apud Bear).
Faz-se através do aumento de ácidos graxos livres no plasma, que por sua vez estão influenciados pela lípase e esta sofre o estímulo da betalipotrofina hipofisária, ACTH,TSH, somatotrofina, triiodotironina, epinefrina e glucagon.Por outro lado, haveria baixa da adenosinofosfatase nos eritrócitos que estaria na dependência da encefalina, havendo também baixa de colecistocinina que iria atuar no centro da saciedade. (Flier et al. 1980).A citocina também se altera (Corces et al 2001).
Haveria falta de utilização periférica da glicose, produzindo hiperglicemia.
Este distúrbio parece ser genético (ratos obesos e hiperglicêmicos de MEYER ou ob,ob) (Meyer.J, 1953) e por deficiência do ácido 3,5,3-triiodotiroacético, que exerce efeito lipocítico por inibir a fosfodiesterase, aumentar glicerol plasmático e por produzir hidroprolinúria (Hols.J.M, 1977) (Miller, et al, 1989), porém a leptina mostra-se diminuída.
Vejamos estes mecanismos com maior detalhe.
Destruindo-se as zonas laterais do hipotálamo (fig.1), produz-se anorexia e o seu estímulo leva á bulimia. Os núcleos ventromedianos exerceriam uma ação inibitória sobre as zonas laterais. A este conjunto dá-se o nome de “ centro de alimentação” e, aquele centro regulado pelo núcleo arqueado e amídala chama-se de “ centro da saciedade”, (conceito este modernamente mais aceito) (Bear et al, 2002) que indicaria o momento em que se deve parar. A bulimia é, pois, devida à excitação do núcleo ventromediano do hipotálamo e reflete sobremaneira os conflitos conscientes e inconscientes.Certos obesos neuróticos comem não por fome e sim por necessidade de segurança ( alimento seria um símbolo de segurança). A dexedrina aumenta a atividade elétrica do núcleo ventromediano e por isso aumenta a inibição do centro da fome (zona lateral), daí a perda do apetite.
O hipotálamo está sob o controle do córtex cerebral, haja visto que, na leucotomia frontal e na hiperosteose frontal interna, o apetite aumenta, o que leva o paciente a engordar.Existem vários relatos na literatura correlacionando trauma cerebral com EEG alterado e o aparecimento de bulimia, confirmando as zonas do apetite e da saciedade. (Yamaguchi, Y. e Suzuki, J. 1980).
Parece não haver dúvida de que deve existir algo no sangue que regula o apetite; ainda mais, as experiências em camundongos em parabiose ( um obeso amarelo possuidor de gene dominante heterozigótico e outro normal, que não desenvolve a obesidade); isto vem confirmar a existência de uma concentração sanguínea aumentada de substância inibidora do apetite influenciando os núcleos hipotalâmicos, chamada leptina. O aumento da leptina faz diminuir a orexina .
Camudongo obeso geneticamente ob/ob tem leptina diminuída. Queda no nível de leptina aumenta o nível de neuropeptídeo Y (NPY) e AgRP que se originam no núcleo arqueado que inibe o núcleo paraventricular e ativa o hipotálamo lateral aumentando o apetite pela produção do peptídeo M.C.H.
O aumento aos níveis de leptina no Sangue é detectado por neurônio do núcleo arqueado que contém peptídeos alfa MSH e Cart.
Um núcleo hipotalâmico parece controlar o outro, mesmo não sendo próximo.Um alfa MSH, peptídeo anorético, e o AgRP, peptídeo anorexigênico exercem efeitos opostos sobre o comportamento alimentar pela interação com o receptor MC4 nos neurônios hipotalâmicos principalmente a orexina. (Bear, M. et al, 2002).
A galanina é similar a orexina e leptina no controle do apetite sendo estimulada pelos triglicerídeos.
A galanina produz a síntese e a liberação do L.H..Esta correlação é importante para explicar a presença das alterações ovarianas na anorexia nervosa nos animais sem dopamina.
Os animais sem dopamina comportam-se como gostassem das comidas mas não a desejassem. Não procura o alimento mas se tiver come.
A estimulação de axônios dopaminérgicos no hipotálamo lateral produz compulsão pelo alimento (como ocorre na bulimia) sem aumentar o efeito hedônico do alimento.
O aumento da serotonina no encéfalo diminui o apetite tal como agem a dexfenflunamina, fluoxetina, etc.
O princípio hipofisário, betalipotrofina (beta-LPH),é o percursor da atividade de outros peptídeos. Desta betalipotrofina derivam a melanotropina (beta-MSH) e endorfina. O anticorpo beta-endorfina reage com a betalipotrofina. No cérebro se dá a síntese dos aminoácidos e suas incorporações para as formações do ACTH, betalipotrofina e endorfina.
Na obesidade da síndrome de Cushing, o ACTH e a betalipotrofina estão aumentados (Kriger,D. et al, 1980), assim como nas mulheres hirsutas por hiperandrogenismo (O’Brien,C. et al, 1982).
A injeção de naxolone impede a ingestão de alimento tanto em ratos normais como em ratos com lesão hipotalâmica, sendo a diminuição da ingestão de alimentos mais acentuada nestes últimos.
O receptor opiáceo localiza-se no núcleo ventromediano. Os animais geneticamente obesos apresentam maior quantidade endógena de beta-endorfina.
Se injetarmos morfina ou endorfina no hipotálamo ventromediano em animais sem apetite, este aumentará consideravelmente, ipso facto, se injetarmos o antagonista opiáceo, naltrexone, produziremos a supressão da hiperfagia (MC.Cloy,J.1979), embora O’BRIEN & col.(1982) não o tenham confirmado na espécie humana.
Devido à correlação desse centro com o córtex, pode-se explicar a obesidade motivada por conflitos psíquicos.
Ratos sob estresse emocional (tipo Ader-Friedman) apresentam aumento dos corpos cetônicos,da glicemia e dos ácidos graxos livres e decréscimo do ferro sanguíneo e da epinefrina na adrenal.(Kingib et al, 1979).
Crianças obesas (38%) mostram deficiência de ferro e moderada baixa de zinco, alteração nas taxas de imunoglobulinas do soro (complementos C3 e C4) e do número de linfócitos T e B, em relação ás crianças normais, o que vem facilitar a maior incidência de infecção nos indivíduos obesos.(3) No homem, a salivação está diminuída nos pacientes depressivos (queixam-se de boca seca). DURANT & ROYSTON,(1980) estudaram em obesas a salivação, a sensação de fome e a quantidade de calorias ingeridas e concluíram que a salivação se mostrou discretamente proporcional à energia ingerida; todavia, a fome e o apetite não variaram significativamente.
O estímulo desse mecanismo hipotalâmico de regulação do apetite parece não ser devido ao tipo de dieta nem á ingestão calórica e sim à manutenção de peso, por ser constante e ideal. Dessa maneira, o magro que coma muito creme, diariamente,pode engordar, mas, com o decorrer do tempo, começaria sentir repugnância e perderia os quilos ganhos.
O mesmo fato ocorre com a gastrectomia, que não impede a obesidade por excitação do hipotálamo; os ratos comem pouco, mas freqüentemente.
O indivíduo normal só come o suficiente para satisfazer o seu apetite, porém o apetite do obeso é exagerado, daí o malogro terapêutico em virtude de não se poder deixa-lo com fome crônica. Os anoréticos funcionam, porém o indivíduo não os ingere a vida inteira, o que leva a engordar de novo.
Certas pessoas não conseguem emagrecer por falta de força de vontade, não somente por apetite exagerado, como também porque os anoréticos lhes causam grande excitação nervosa. O excesso de apetite reflete, muitas vezes, a insatisfação psíquica.
Em certos casos, a causa da obesidade não só seria, portanto, o excesso de alimentação ou a falta de exercício físico, como também poderia ser devida ao consumo diminuído de energia (queimam menos calorias) por defeito genético; hipóteses estas que precisam ser confirmadas.
A nosso ver, excesso ou falta de apetite, embora inato, dependeria dos primeiros meses de vida,no contato do bebê para com a mãe – é o primeiro período de molde.Todavia, HEBB,D. (apud Bruch pág.245) acha que a sensação de saciar-se não é inata e dependerá da educação.BRUCH (1973) acha que o fator genético sofre também influência do meio. O recém-nado não é mais a tabula rasa do homúnculo.A criança pode aprender, em determinados períodos de tempo, e, para o apetite, aprende desde o momento do nascimento.
(*) Para melhores detalhes sobre período de molde consultar o meu livro (1991).
Existem dois tipos de apetite: 1) fome por alimento;2) fome pelo que o alimento simboliza ou representa (afeto).Neste último caso, é que a insacibilidade torna-se importante.
Estas condições dependem do primeiro relacionamento com a mãe.
Esta não tendo capacidade de reconhecer o choro da criança, se for fome, estar suja ou molhada, estar com calor ou por necessidade de afeto, poderá produzir uma desorganização no bebê em relação ao apetite.Daí a importância da eficácia da psicoterapia para o obeso: o terapeuta deverá saber distinguir os diversos tipos de angústia do paciente, relacionados ou não com os alimentos.
Acredito em fome inata tal qual descreveu FREUDS (1948), porém fatores ambientais podem desenvolver em demasia esta condição instintiva.
Para melhor compreendermos a importância dos instintos e a complexidade do seu funcionamento, exemplificaremos com o instinto de fome a posição esquizoparanóide de KLEIN & col.(1969); sabemos que a fome, e a subseqüente hipoglicemis que acarreta,produz mal-estar, e, em certas pessoas, leva à angústia e à irritabilidade hostil; sabemos, também, que na fase esquizóide da lactação a criança está fragmentada;quando não predomina a fome, em relação às outras necessidades instintivas, tornam-se débeis e desagregam-se, concentrando todos os esforços de defesa na sucção mamária; porém em fantasia inconsciente e instintiva agride o seio que o nutre, porque também este o frustra, o que resulta em um sentimento de culpa, levando à criança entrar com dificuldade na fase depressiva, que é reparadora.
Segundo LIMA,O;(1963), o indivíduo nasce com maior ou menor apetite, dependendo da sua constituição mesomórfica ou ectomórfica; o esquizofrênico melhora com a insulinoterapia, porque a hipoglicemia produzida pela insulina faz reavivar o instinto de fome e com ela a agregação da personalidade fragmentada, saindo assim da posição esquizóide e entrando através da agressão, na fase paranóide.A provocação do instinto da fome, e um esforço para sacia-la, reforçaria, no esquizofrênico, os instintos parciais, isto é, as cargas efetivas da fome, produzindo, então, a reintegração da personalidade.
A sucção dos seios é a “primeira maneira do indivíduo de expressar amor”; se o seio frustra,surge, então, uma ansiedade decorrente do perigo de tratar o seio, e depois a mãe toda, por represália.
No estado esquizóide, o trauma do primeiro período oral de sucção conduz a uma reação conforme a idéia de que o amor da criança, sua necessidade libidinosa ao seu objeto de amor, o seio materno, é mau e destrutivo, de maneira que chega a ter medo de amar, porque o amor é destruidor, e vai ao estado esquizóide típico.Em um segundo período, o trauma do segundo período oral provoca na criança a idéia de que não é amada, porque o seu ódio é mau e destruidor;chega à angústia de amar por medo de odiar, pois o amor está contaminado pelo ódio. Estes estados formam a base da obesidade futura, sendo ela, então, uma manifestação direta da dependência infantil.
Conforme ascendemos na escala filogenética,os instintos se entibiam e submetem-se cada vez mais ás exigências da cultura, como sistema de adaptação.
A primeira vista, um indivíduo com fome seria o resto da vida feliz se estivesse garantido o seu sustento; contudo, o homem só vive para comer quando há fome, porém, quando está satisfeito com o alimento, aparecem outras necessidades de nível superior que dominam o organismo mais do que as necessidades básicas.Há, pois, uma hierarquia de instinto de predomínio relativo. A satisfação é, na teoria da motivação, um conceito tão decisivo como a privação, pois libera o organismo das necessidades fisiológicas.Se as necessidades fisiológicas estão satisfeitas, como as de segurança, aparece, então, a necessidade de amor, afeto ou posse; se essas necessidades psicológicas não são satisfeitas, torna-se frustrado e mal ajustado, com comportamento neurótico, isto é, a satisfação de auto-apreço, de autoconfiança, capacidade de ser útil à humanidade é tão necessária como a satisfação da fome, do sexo, etc., pois as suas insatisfações causam sentimentos de inferioridade, impotência e depressão.Então, a depressão, a ansiedade e outras emoções tomam parte importante na patogenia da obesidade.
O paciente obeso, na maioria das vezes, tem, pois, um inapropriado reconhecimento da saciedade e ele não tem “fibra”, isto é, tem pouca iniciativa quando confronta novas situações, tais como em regime, na escola, no trabalho ou na sociedade.
Certas pessoas não conseguem emagrecer por falta de força de vontade, não somente por apetite exagerado, como também porque as drogas anoréticas lhes causam grande excitação nervosa. O excesso de apetite reflete muitas vezes a insatisfação psíquica. Por exemplo, o bebê, quando chora, sente-se mal;logo que come, sente-se bem; uma vez adulto, diante de qualquer aborrecimento ou tensão nervosa, come para sentir-se bem,tal como fazia quando bebê.
Em linguagem “bioniana”: introjeta o objeto bom para combater o desconforto causado pelo “não seio”, mas, muitas vezes, ingere d acordo com as suas fantasias, o seio mau, o que vai causar maior insatisfação do que a própria fome (Miller Paiva, 1991).
Certos obesos, consciente ou inconscientemente, encontram portanto, no alimento, uma forma de amortecer suas emoções.
O alimento pode ser, além de um substituto do amor, uma expressão de amor- “fulana é uma uva”, “fulano é um doce de coco”- como pode ser expressão de descontentamento – “fulano é um abacaxi”.
(*) Tanatismo: é o prazer de sofrer (autopunição) com intuito (inconsciente) de agredir outrem.
É comum o conceito de que, ao se visitar uma pessoa e não se recebendo da mesma café com bolo ou um aperitivo, não se estaria sendo recebido com carinho. A mãe, que referindo-se ao alimento, diz: “você ficará mais forte se comer bem”, estará concorrendo para fixar no alimento os futuros problemas emocionais de segurança.
Tivemos uma paciente solteirona que não podia conciliar o sono se não ingerisse tabletes de chocolate; durante sua análise, foi descoberto que o chocolate simboliza seio materno. Na infância fora criada por mãe pouca afetiva e agressiva; não conheceu o pai. Jamais conseguiu amar um homem por medo de ser um dia abandonada; só em pensar nesse tipo de sofrimento, preferia nem começar um namoro. A sua adiposidade era uma defesa, pois se emagrecesse ficaria “apetitosa”, isto é, desejada, o que represntaria um perigo: entregar-se sexualmente e depois ser rejeitada.
A análise mais profunda revelou não somente essas causas da obesidade, mas também o desejo inconsciente de agredir a mãe, não se casando ( era o maior sonho de sua mãe!); por esse motivo, o medo de casar e ser abandonada era devido ao sistema bumerangue: eu agrido e tenho pavor d ser agredida pelo objeto bizarro, isto é, transformaria o cônjuge como sendo capaz de ter grande poder de maldição.
É, portanto, a obesidade por tanatismo, isto é, agride-se pela obesidade e com isso irá agredir outra pessoa.
Tivemos, também, o caso de uma mulher para qual o alimento era um substituto do carinho, pois o marido era jogador e passava a maior parte do tempo fora de casa, e a paciente não se distraia.
Comer era alimentar-se de amor, mas era, também, agredir o marido, que detestava mulher obesa.
Por outro lado, o alimento pode significar segurança, tal como o caso de um paciente religioso que fora criado na pobreza e cujos alimentos não podiam ser desperdiçados.Comia tudo o que lhe punham no prato sem deixar migalha.Desperdiçar alimento seria pecado!
As mães, neuróticas salientam demasiadamente a importância dos alimentos; querem que os filhos comam tudo que colocam no prato com o intuito de protege-los contra as doenças. Pode acontecer que um indivíduo criado nessas condições, quando tiver um prejuízo financeiro ou fortes aborrecimentos, deixe de comer não só por falta de apetite ou por falta de prazer em viver, ma, também, por falta de proteção (materna).O fato contrário, como já foi dito, poderá ocorrer: comer demasiadamente para se proteger.A satisfação do apetite é, além de motivo de prazer, um símbolo de segurança.Um adulto que não encontra satisfação na vida, rechaça o intenso desejo de afeto dos demais e se refugia nas pautas primárias da conduta, as insatisfações orais. Tenho observado maior dificuldade na execução do regime em obesas criadas por mães pouco afetuosas.Esse tipo de obesidade não se enquadra no tanatismo.
É na hora das refeições que a família se reúne.É nesse momento que se discute os problemas individuais e sociais, domésticos, religiosos, etc.
E é nesse momento que fica relacionado o alimento com o motivo da discussão.Pode haver uma superposição de imagens (por exemplo, ao se comer uma torta de camarão, discute-se um assunto extremamente desagradável; relacionando-se, posteriormente, esse prato com aquele assunto, deixar-se-á aprecia-lo e o portanto não será mais apetitoso.
Durante o tratamento psicanalítico, descobrem-se regressões oral-digestivas conseqüentes às proibições genitais de uma mãe má, tal proibição condicionada a determinados alimentos, por exemplo: um indivíduo não come carne por ter esta um significado genital latente (pênis), embora necessite dela por representar um símbolo de segurança.
Por outro lado, a alimentação farinácea e Láctea, que leva a engordar, pode ter um significado de proteção materna. Todavia, esta proteção poderá ser falsa; seria como uma bola envolta por uma pequena camada libídica, mas seu conteúdo repleto de coisas ruins, objetos tanáticos.Esta obesidade “farinácea” seria uma identificação com a mãe falsamente boa; torna-se-á um tanatismo se este obeso por querer, inconscientemente, agredir a mãe, não se casar.
Consideramos a obesidade como sendo provocada por uma mãe má internalizada, proibidora da genitalidade do indivíduo (castradora) e obrigando a se alimentar de substâncias gordurosas, sendo estas um substituto materno, o que poderia chamar de obesidade de penalidade (“kummerspeck”).
Temos observado que certos indivíduos engordam para agredir outrem, tais como a mãe, pai, marido, esposa,etc., seria forma sutil de predomínio do instinto de morte.
Segundo a nossa experiência psicanalítica, a maioria dos obesos tem causas entrelaçadas, como para aliviar a ansiedade de uma autodestruição por sentimentos culposos.É neste caso que a obesidade por agressão, e para se agredir, está incluída nos casos de tanatismo.
Em certos casos, a dificuldade de executar o regime reside na vontade do marido não gostar de mulher magra. A obesidade da esposa, motivo de pouca atração ao sexo oposto, seria um meio para se proteger de uma esposa adultera. Seria um complexo de inferioridade e insegurança do homem.
Algumas vezes a polifagia seria uma forma de insatisfação sexual, seria um desejo inconsciente de fazer a felação ou cunillingus.
Há obesos que abjuram tanto a adiposidade, que chegam a sonhar com palanque enferrujado, pau podre, o que teria o significado de envelhecimento e autodesprezo. Outros adoram tanto os alimentos, que em sonhos participam de lautos manjares.
Há indivíduos gordos que só vivem para comer e dormir; seriam lactantes semelhantes ao Joe Dickens nas “Aventuras de Pickwick” ou ao Sancho de Cervantes.
Quanto aos fatores que agem nos obesos, seriam eles:1) predomínio genético;2) exaltação da passividade e supervalorização dos hábitos orais transmitidos pelos grupos familiares;3) pouca disposição para o exercício;4) filho superprotegido;5) pai ausente ou débil; nestas condições, há fixação na fase oral e hipotrofia da anal e genital;6) conflitos inconscientes, objeto mau internalizado;7) por tanatismo, agredir para ser agredido.
Outra forma, porém mais grave de tanatismo, vamos encontrar no obeso com diabetes melito e que executa mal o tratamento, isto é,não faz certo o regime (muitas vezes por achar que com as sulfas não haveria necessidade do regime) e acaba com aterosclerose, hipertensão e acidentes vasculares.
Devemos relacionar o paciente diabético com o obeso, no sentido psicológico, não só porque existe uma incidência maior de diabéticos em indivíduos obesos e predisposição genética em ambos, mas principalmente porque eles reagem aos traumas psicológicos, conscientes ou inconscientes, da mesma maneira, isto é, pela bulimia, ou melhor, pela maior excitabilidade dos núcleos ventromedianos do hipotálamo.Os indivíduos podem reagir de maneira diferente aos mesmos traumas.Em geral, os obesos ou diabéticos tiveram traumas na fase oral, motivo pelo qual qualquer emoção, boa ou má, os faz comer ou ingerir alguma coisa. A satisfação oral para o gastrônomo é tão importante que constitui uma diversão especial, igualando-se a qualquer outro tipo de festa, e o diabético é um gastrônomo de hábito constante.O diabético, tal como o obeso, é uma criança: mente, rouba, “faz feio” e torna-se egoísta para satisfazer o seu apetite; se a educação não permite, comporta-se como um cavalheiro ou uma dama na sociedade, para depois chegar em casa abrir a geladeira e o armário, “devorando” os doces e comidas, “supercompensado” o que não pode fazer na frente dos parentes, “controladores” e “supervisore” de sua doença.
A dificuldade do tratamento dietético ou diabético e do obeso reside na sua falta de força de vontade e na sua “capacidade de mentir” ao médico, no sentido de ter executado de maneira exata a dieta prescrita.Em grande número de vezes “mentem inconscientemente”.
De acordo como descrevi, os obesos tanáticos, e pela exposição sobre a psicopatologia do excesso de apetite, as causas da obesidade são várias e mesmo a obesidade essencial ou constitucional ou por erro metabólio apresenta pluralidade de fatores, o que torna mais difícil a sua compreensão.
Todavia, a nossa experiência clínica nos faz crer na importância capital da medicina prolifática. O indivíduo, mesmo antes de casar, deve se reeducar tanto no ponto de vista de higiene física como psíquica.Por este motivo, acho indispensável um tratamento combinado:psicoterapeuta, endocrinologista,fisioterapeuta, nutricionista e assistente social.
Pelo exposto fica evidente que em certos obesos o exercício aumenta a polifagia e em outros queima mais calorias; neste tipo e que se deve prescrever o exercício físico.Certos indivíduos têm tipo de obesidade hidrófila, isto é, com alteração do hormônio autidiurético.Nestes casos, um diurético, tal como a hidroclorotazida, poderá ser de utilidade no início do tratamento, porém, por resistência e autopunição inconsciente (não tendo o direito de emagrecer por sentimento inconsciente d culpa), o medicamento não pode surtir o efeito desejado, isto é, diurético.Aliás, em geral, o obesos retém menos água ( o conteúdo hídrico nos tecidos adiposos é até inferior, em porcentagem, ao conteúdo do teido gorduroso do indivíduo normal) (MOURSE apud CUCURACHI &col. (1979). Por outro lado, o endocrinologista deveria prescrever um anorético para um obeso neurótico, porém somente em concordância com o psicoterapeuta (pois existem obesos que “parecem tolerar” estas drogas, mas só o psicoterapeuta saberá da gravidade do seu estado psíquico, isto é, se ele terá tendência a reagir à droga). Todo cuidado será pouco. O psicoterapeuta jamais deverá ser impaciente com o paciente quando este abandona a dieta (mesmo sendo criança); orientar a família da necessidade do regime de toda família (“ o que os olhos não vêem, a boca não sente”). O psicoterapeuta de formação analítica somente interpretará a própria atitude e deverá ficar neutro para receber tanto o bom como o ruim do paciente e devolver sempre o bom para a suficiente segurança do indivíduo, para assim ele não se utilizar da somatização.
O tratamento da obesidade seria, portanto, eclético e principalmente pofilático, evitando-se na família os desajustes dos pais que podem traumatizar o indivíduo nos períodos de molde e assim não ocorreriam confusões emocionais causadoras de excesso de apetite. A psicanálise ou psicoterapia psicanalítica de grupo e o regime alimentar associado (por outro especialista), são, no dia de hoje, a maior arma que se dispõe para o combate desse mal social, pois o obeso é vitima de atitudes sarcásticas e jogosas o que ocasiona desgostos e infelicidade.
O paciente acaba percebendo que Deus nos fez diferentes, que cada um tem um defeito ou um desajuste.O obeso, por sua vez, nasceu com essa constituição; mas sendo um defeito corrigível, deve-se consolar.A maioria deles pode, uma vez normalizado o peso, abusar 2 e até 3 vezes por semana, ou em aniversários ou festas, o que já é uma grande coisa.Os pacientes ficam também sabendo das conseqüências da obesidade, como a insuficiência cardíaca, hipertensão e complexo de inferioridade, o que poderá ajudar o indivíduo a executar o regime.
Pela minha experiência de tantos anos, recomendo em primeiro lugar a psicoterapia analítica de grupo, duas vezes por semana, associada a análise individual por semana. É de duração longa, mas não vai somente ajudar o paciente emagrecer e sim amadurecer a sua personalidade para ser feliz no lar, na sociedade e no trabalho.
Finalmente, posso dizer, baseando em minha experiência que o obeso está dominado pelo instinto de morte (autodestruição); o tratamento da obesidade depende, portanto, mais dos conflitos inconscientes produtores de culpa e tanatismo, do que de dieta, drogas e exercício.
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